A REVOLUÇÃO DO FOLCLORE ATRAVÉS DE MONTEIRO LOBATO

O Saci-Pererê é a entidade mais conhecida do folclore brasileiro. Um menino negro e travesso que tem apenas uma perna. A origem da lenda caracteriza a miscigenação entre as culturas indígena, africana e europeia. A lenda mais popular fala sobre um ser pequeno que protege a selva. Pode ter os olhos vermelhos, é careca e usa um gorro vermelho. Normalmente está fumando um cachimbo.

A princípio, o Saci era narrado como um garoto indígena, muito travesso, que tinha um rabo, duas pernas e pele morena. Essas características faziam parte do imaginário das tribos indígenas da região sul, de origem tupi-guarani, local onde surgiu a lenda do Saci-Pererê.

Considerações sobre a origem à parte, ele está sempre aprontando e algumas de suas travessuras mais comuns são o ato de trançar as crinas e rabos dos cavalos e azedar os alimentos. Ele tem um assovio estridente e dificilmente você vai encontrá-lo por aí. Talvez poderá caçá-lo em um redemoinho e prendê-lo em uma garrafa. Se assim o fizer, poderá roubar-lhe o gorro vermelho, fazendo com que o pequeno atenda seus pedidos.

Tudo isso é familiar para você? Então continue a leitura para entender um pouco mais sobre a importância dessa lenda.

A lenda surgiu no final do século XVIII e se espalhou pelo país ao longo do século XIX. A história, provavelmente, começou na região Sul e se tornou conhecida em todo o país e também em outros países da América do Sul, sofrendo algumas variações. A lenda era bastante conhecida no interior do país, mas não passava muito disso.

E a história poderia parar por aí, não fosse Monteiro Lobato fazer parte de um grupo de intelectuais nacionalistas que estudavam as características culturais de cada canto do país e o cotidiano dos mesmos. Esse grupo buscava maneiras de dar um tom brasileiro para tudo aquilo que fosse possível, fugindo da influência de outros países. E durante esses estudos, Lobato decidiu entender um pouco mais sobre o Saci-Pererê tão conhecido no interior do Brasil.

Até então, ele trabalhava como crítico sociocultural, escrevendo sobre o caboclo e tudo o que envolvia o lado mais interiorano do país. No ano 1916, ele publica o texto “A poesia de Ricardo Gonçalves”, na Revista do Brasil. Nesse trecho, é possível compreender quais eram suas intenções:

“Pelos canteiros de grama inglesa há figurinhas de anões germânicos […] porque tais nibelungices, mudas à nossa alma, e não sacis-pererês, caiporas, mães d'água e mais duendes criados pela imaginação do povo?” (LOBATO, 1916, p. 299).

Através do seu inconformismo com a falta de identidade do Brasil, surge a ideia de explorar mais a fundo a lenda brasileira do Saci-Pererê. E, no começo de 1917, Lobato realizou um inquérito no jornal "O Estado de São Paulo" – na versão vespertina chamada "Estadinho", mais especificamente – sobre o Saci. A ideia era colher as respostas dos leitores acerca das versões da lenda.

Monteiro Lobato recebeu dezenas de respostas, encorajando-o a fazer, em seguida, um “Concurso de pintura e escultura”, visto que o inquérito despertou algo em sua alma. Como essas primeiras ações foram um verdadeiro sucesso, Lobato se lança em sua primeira aventura editorial, publicando "O Saci-Pererê: Resultado de um Inquérito". O livro teve duas edições esgotadas em menos de um ano, com uma tiragem de 7.300 exemplares (Lobato, 1944, p. 371; Cavalheiro, 1955, p. 192). O saci entra, definitivamente, para o hall da fama do imaginário brasileiro.

No ano 1921, a obra "O Saci" é criada para o público infantil, norteando, de vez, a carreira do pai da literatura infantil. E toda essa inquietude de Lobato mostra um homem múltiplo, que articula várias ações em torno de uma ideia. Excelente jornalista, crítico sociocultural, editor, escritor e publicitário.

Nessa altura, o pequeno menino negro de gorro vermelho já encantava o país através de histórias cheias de magia e imaginação, um prato cheio para as crianças da época que mal tinham com o que contar, em termos de literatura.

Monteiro Lobato conseguiu dar voz ao folclore nacional, enriquecendo ainda mais a cultura nacional. Sem dúvida, ele foi o grande responsável por popularizar a lenda do Saci em todo o país. Certamente ficaria muito feliz se pudesse viajar no tempo e ver que o Saci-Pererê ganhou uma data exclusiva – 31 de outubro – batendo de frente com a imensa fama do Halloween estrangeiro.

Lobato não apenas transformou o Saci na lenda mais popular do Brasil, como também trouxe para todos diversas outras lendas, como a Iara, o Curupira e tantas outras entidades que carregam as histórias de um Brasil continental e diverso.

Claro que muito ainda precisa ser feito para a popularização da data. Mas esse é um assunto para um próximo artigo. Hoje, basta termos consciência que Lobato mudou o destino do Saci (ou o Saci mudou o destino de Lobato?). No dia 31 de outubro, comemore o Dia do Saci, esse menino travesso que encantou e encanta os corações de incontáveis gerações.

Dia Nacional do Livro e Semana do Saci. Quer combinação melhor para Lobato?

Livro e Lobato, mais do que começar com a mesma letra, possuem histórias em comum. Eu adoraria contar a importância de Lobato na produção e distribuição de livros no Brasil, mas o Instagram não suporta tantas letras. Então, de forma resumida: o que Lobato fez pelos livros é visto como um divisor de águas. Ele inovou, modernizou e ampliou as arcaicas práticas editoriais e promoveu a popularização da leitura.

E já que é Semana do Saci, vale a pena conhecer essa passagem: Passeando com um amigo pelo Jardim da Luz, surgiu o assunto "folclore brasileiro". Lobato estava focado em tornar o Brasil uma nação orgulhosa de suas raízes, como seu folclore. Observando os anõezinhos e outros gnomos que enfeitavam o jardim, comentou com o amigo que deveriam trocá-los por estatuetas de outros entes verdadeiramente brasileiros.

Surge a ideia de fazer uma pesquisa em 1917, com o título "Mitologia Brasílica”. Lobato lança no "Estadinho", edição do "O Estado de São Paulo", uma pesquisa sobre o Saci-Pererê, entidade com raízes num mito tupi-guarani surgido há mais de 2 séculos. O material coletado revelou que o Saci também veio ao Brasil através de histórias africanas trazidas pelos ex-escravizados e passou por transformações caboclas.

Choveram cartas que vinham do país todo. Lobato aplicou uma técnica inédita de coleta de dados e diante da diversidade do material recebido, surgiu o livro "O Saci-Pererê – Resultado de um Inquérito", no inicio de 1918. O saci despertou a consciência e a autoestima do povo brasileiro, pois como diz Lobato no epílogo deste livro: ”revelar onde e o como se hão de buscar os elementos de estudo e compreensão de nós mesmos”. Isso é nossa essência. Isso é ser verdadeiramente brasileiro.

Apesar de assinar o livro somente com suas iniciais, podemos considerá-lo o primeiro livro do escritor, precedendo Urupês. Então comemore o Dia do Livro lendo "O Saci-Pererê – Resultado de um Inquérito" que mostra um Brasil que acompanhava os horrores da 1ª Guerra Mundial e se descobria como nação!
E se você quer ter acesso às obras de Lobato, conhecer sua história e se atualizar acerca do que acontece atualmente, acesse o site www.monteirolobato.com o link está na BIO!

Você conhece a origem da lenda do Saci?

O folclore brasileiro é rico, diverso e é possível encontrá-lo durante todo o ano, em todos os cantos. As lendas que estruturam esse folclore são verdadeiros patrimônios. E, sem dúvida, o Saci-Pererê é a lenda mais famosa de todas, que teve início no Sul do Brasil, influenciada por elementos das culturas africana, europeia e indígena. E, claro, teve a imensa influência de Monteiro Lobato.

O ser mítico que mora nas florestas é conhecido por ser travesso e estar sempre aprontando com pessoas e animais. Na maior parte das histórias, ele é pequeno, negro, tem uma perna só, usa um gorro vermelho que lhe dá poderes e fuma um cachimbo. Muitas histórias usam a expressão “endiabrado” para designá-lo, visto que é um menino agitado e viciado em travessuras.

Não existe apenas um Saci. Eles são muitos aprontando com cavalos, fazendeiros e viajantes que encontram por onde passam, deixando-os com os cabelos arrepiados com seu assovio estridente. E tem muita gente que jura, até os dias de hoje, que já encontraram o menino brincalhão por aí, armando mais alguma de suas travessuras.

Os contadores de histórias sempre enfatizam que ele mora no redemoinho e que é possível capturá-lo. Para isso, basta jogar uma peneira no meio do redemoinho. Em seguida, é preciso retirar o gorro de sua cabeça para que ele perca os poderes. Por fim, tem que prendê-lo em uma garrafa com uma cruz desenhada nela.

Muitas histórias apontam que o Saci vive cerca de 77 anos e, após esse espaço de tempo, se transforma em um cogumelo venenoso ou um cogumelo que pode ser encontrado nos troncos das árvores, os chamados “orelha-de-pau”.

Os folcloristas falam que a sua lenda é recontada desde o final do século XVIII ou começo do século XIX e começou na região Sul do Brasil entre os índios guarani que o chamavam de "çaa cy perereg". A lenda ficou tão famosa que se espalhou pelos países vizinhos. Na Argentina, Uruguai e Paraguai, por exemplo, ele é chamado de "yacy-yateré" e cada região conta histórias carregadas de suas próprias características.
Os folcloristas também apontam diversas lendas europeias que podem ter influenciado a lenda do Saci, como o trasgo, um ser pequeno que faz maldades com os portugueses. O cachimbo viria das culturas indígena e africana e a perna única viria da cultura africana, já que – para eles – o Saci perdeu a perna em uma luta de capoeira.

Em sua origem, o Saci protege as florestas e ele ficou imensuravelmente famoso através de Monteiro Lobato que, em 1917, fez o inquérito que eu falei a respeito dia desses. Aliás, se perdeu, volta o feed uns dias que você vai entender a importância desse inquérito que contou com um retorno muito maior do que se esperava e, ali, iniciava a parceria Monteiro Lobato – Saci-Pererê.

Mas vale lembrar que Lobato não apenas deu voz ao Saci, como também mostrou ao mundo todos os outros personagens do folclore nacional como a Iara, o Curupira e tantos outros que carregam nossa história de forma lúdica, gerando emoções em crianças de todas as idades. Mas essa é uma história para outro post.

Dia Nacional do Livro: Monteiro Lobato e a Evolução da Literatura Infantil

A Literatura Infantil no Brasil começou na segunda metade do século XIX. A forma como as histórias eram passadas de geração em geração, acontecia através das histórias contadas e recontadas por pessoas chamadas de “preto velho”. O apelido carinhoso indica os “contadores de histórias” tão necessários em diferentes âmbitos. Outro exemplo de histórias que atravessaram as décadas, é o folclore gaúcho com o Negrinho do Pastoreio e as histórias que vieram da Europa como os "Contos da Carochinha".

Em 1921, Monteiro Lobato presenteia o país com o livro “Narizinho Arrebitado”. Com uma técnica literária impecável, a maneira como as histórias são contadas para as crianças ganham um tom lúdico ideal para conscientizar sobre o mundo. Lobato deu as diretrizes para as próximas gerações de escritores que trabalhavam e trabalham com a Literatura Infantil.

Ele criou um universo encantador que atraía crianças de todas as idades. O folclore, o nacionalismo, a linguagem, os comportamentos e a relação com a natureza podem ser considerados as espinhas dorsais de toda sua obra. E Lobato já deu voz aos contadores de histórias, criando o sábio Visconde de Sabugosa.

Em 1931, "Narizinho Arrebitado" se transforma em "Reinações de Narizinho". Nos anos 60 e 70 a Literatura Infantil se torna pauta séria, e as instituições começam a entender a importância da leitura e do livro infantil para as crianças. A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil foi uma dessas instituições que lutou pelo envolvimento das crianças com a literatura.

Com a valorização da criança, surgem os textos adaptados a elas e até mesmo os livros adultos tomam forma de livros infantis, marcando o início da formação de leitores ainda com pouca idade. Foi criado, então, um Tratado de Pedagogia, que assegurava a educação infantil e adulta. A educação perde sua inocência e a escola passa a ser atuante na formação dos cidadãos.

E claro que com um maior número de leitores, surge a necessidade de mais e mais livros para as crianças. Como elas possuem um foco que facilmente muda de direção, os livros tinham que chamar a atenção, baseadas no mundo do faz-de-contas. E Monteiro Lobato conseguiu conciliar todas as necessidades dos pequenos.

Através do seu universo imaginário, Lobato leva até as crianças os fatos políticos-econômicos-sociais que envolviam a vida, naquela época, no Brasil. Um exemplo é o mais famoso de todos, “O Sítio do Picapau Amarelo”, que mostra através de livros como "O Poço do Visconde" a sua revolta com a maneira como acontecia a exploração do Petróleo na época.

Através de suas personagens cativantes, Lobato dizia tudo aquilo que sentia que precisava dizer de uma maneira que não expunha sua imagem. A Emília, por exemplo, é a voz do escritor contestador e que sempre procura maneiras de reinventar não apenas a natureza, mas todo o planeta.

Com Dona Benta, Tia Nastácia, Tio Barnabé, Pedrinho, Narizinho, Emília, Visconde de Sabugosa, Quindim e Rabicó, Lobato formou diversas gerações com um senso crítico muito mais apurado do que as crianças que, até sua reestruturação, não compreendiam o mundo da mesma maneira que as que vieram após o escritor.

O folclore nacional ganhou palco e respeito. Seres fantásticos como o Saci, a Cuca, a Mula-sem-cabeça, a Iara, o Lobisomem e tantos outros levam os leitores a conhecerem mais da cultura brasileira e a importância dos cuidados com a natureza. Toda obra que gera magia e sonhos, é caracterizada como Literatura Infantil. E Lobato fez com grande competência.

Hoje em dia, essa magia se perdeu. Temas polêmicos e personagens sem nenhum encantamento invadem os livros das crianças. Sendo assim, é fundamental sair em defesa de um sítio mágico, com boneca falante e sabugo de milho que conta histórias. Onde tem menino tão explorador quanto Marcopolo e uma vovó sempre disposta a amar e cuidar.

Monteiro Lobato é considerado o pai da Literatura Infantil brasileira e não poderia ter um "título" diferente. Seus livros eram verdadeiras moradas, cheias de revoluções e lições para todas as pessoas do mundo. Foram mais de quatro mil e seiscentas páginas somente para as crianças. Uma obra-prima que merece todo o reconhecimento.

Se comunicar com crianças é como se comunicar com adultos, dadas as devidas proporções. As ideias precisam ser transmitidas, as mensagens precisam ser passadas mas com complexidade diferente. É assim que se formam seres humanos. A literatura precisa causar sensações, emoções, imaginações em todos. Em especial, no que tange as crianças, elas precisam tocar o coração, cumprindo a função verdadeira da Literatura.

Por mais Lobatos para esses pequenos humanos que, com as diretrizes corretas, vão transformar o mundo em um lugar muito melhor e mais justo para todos.