DE VOLTA AO SÍTIO – III – FAZ-DE-CONTA

DE VOLTA AO SÍTIO – III – FAZ-DE-CONTA

De Volta ao Sítio

Por Décio Diniz

III - Faz-de-conta

Depois do jantar todos estavam a postos na sala, esperando por dona Benta. Tia Nastácia já havia sentado no sofá e fechava os olhos de sono.

- Não disse que ela já sabe da novidade? Já dorme tranquila o sono dos despreocupados, enquanto a gente fica aqui morrendo de curiosidade.

- Quieta, Emília! Deixa a tia Nastácia em paz. Vovó já está chegando.

Dona Benta entrou com um envelope na mão, e sentou-se em sua cadeira de balanço.

- Hoje recebi esta carta de São Paulo.

- São Paulo? De quem, vovó? - perguntou Narizinho.

- Algum restaurante famoso querendo contratar tia Nastácia? - brincou Pedrinho, rindo-se da pobre Nastácia que abria os olhos, assustada: "Que foi?"

- Que restaurante nada. Para mim é do Dom Pedro!

- Que Dom Pedro, Emília?

- Aquele que deu o "brado retumbante" às margens do rio Ipiranga, ora! Isso não foi em São Paulo?

- Acorda, Emília. Isso foi a quase duzentos anos!

Dona Benta ria-se daquilo tudo.

- Deixem a imaginação para depois, criançada. A carta não é de nenhum restaurante, muito menos de Dom Pedro I. Escutem que eu vou ler para vocês: "Querida dona Benta, há muito queria lhe escrever..."

Quando dona Benta terminou, Emília estava pensativa, com os dedos no queixo, olhar para cima.

- Então, pessoal, o que vocês me dizem disso? - perguntou dona Benta.

- O que será que ele quer aqui no sítio, vovó?

- Quem sabe ele quer fazer um filme, Narizinho! Ou uma entrevista, ou um documentário para a televisão?

- Será, Pedrinho? Ele disse que sente saudade daqui sem nunca ter vindo ao sítio.

- Mas disse também que em seus sonhos passou a infância aqui conosco - lembrou o Visconde.

- Esta parte me interessa - gritou Emília. Se ele não é mais criança, mas esteve aqui quando criança, e foi em sonho, então tem a ver com o faz-de-conta, e de faz-de-conta eu entendo.

- E ele apelou para você, Emília. Não sabe como chegar até aqui, mas acredita que você tem uma solução para isso.

- É claro que tenho. É como eu sempre digo, adulto se aperta por tão pouca coisa!

- E qual é a solução, Emília?

- Responda a carta, dona Benta. Diga que venha sim, que queremos conhecê-lo e descobrir o que ele quer realmente. Diga que venha logo porque já estamos esperando.

- Ela fala como se fosse a dona do sítio!

- Sei muito bem que a dona é a sua avó, Narizinho! Mas sei também que dona Benta nunca faria essa desfeita a alguém que quer conhecer o sítio.

- E não farei mesmo, Emília. Mas, afinal, ele quer saber como vir. O que eu respondo, bonequinha?

- Muito fácil. Diga para ele arrumar as malas, ficar prontinho e fechar os olhos com bastante força. Quando abrir novamente estaremos na porteira para recebê-lo.